Reportagem - CICLO DA VIDA
Globo repórter - edição de 04/06/2010


Câmera flagra beija-flor parado no ar em pleno voo
Segredo está na rapidez e no movimento das asas da ave, que chegam a bater 80 vezes por segundo.

A nossa percepção é limitada. Do alto, ao enxergamos a floresta, não vemos a árvore. Na terra, ao vermos a árvore, não percebemos o crescimento dela. É fácil saber quanta madeira uma árvore renderia. Mas qual o valor dela para inúmeras outras formas de vida? Para responder a essa pergunta, não basta um simples olhar. É preciso observar, esquecer o relógio e se transformar em uma testemunha do tempo.

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Os beija-flores formam o grupo das menores aves do mundo – pesam entre 2 e 21 gramas. E é um privilégio poder contemplar essas joias da natureza, uma vez que os beija-flores só existem nas Américas e em nenhum outro lugar do mundo. Quando pousados, já encantam. Só assim podemos admirar facilmente a variedade de espécies e suas cores metálicas.

A iridescência das penas se revela e impressiona. É como se a pequena ave tivesse luz própria, um brilho que esbanja beleza. Seria para atrair a fêmea? É provável, já que as fêmeas costumam ser menos coloridas. Mas o que dizer do beija-flor-preto-e-branco?

Se faltam cores, sobram cuidados com as penas. Na hora do banho, todas têm que ser bem limpas.

Com os beija-flores, a natureza prova que tamanho não é documento. No mundo das aves, eles são os menores. Por outro lado, são também os mais rápidos, capazes de proezas que nenhuma outra ave consegue.

Mestres do voo, param no ar, rodopiam e fazem curvas, voando de marcha a ré. Como bailarinos do ar, parecem não ter limites e desafiam a gravidade com manobras ousadas, sempre atrás do alimento: o néctar das flores.

Mas o beija-flor come para voar ou voa para comer? "As duas coisas, porque o beija-flor é uma ave com uma dieta bem especializada. Ao todo, 90% da sua alimentação são de néctar. E os outros 10% estão entre pólen e pequenos invertebrados. Os ossos que correspondem aos braços do beija-flor são muito curtos. E 70% da asa do beija-flor correspondem ao que seria nossa mão, só que são ossos fundidos e alongados. Essa forma permite ao beija-flor ter a articulação do ombro mais livre. Ele consegue rotacionar cerca de 180°. Então, ele consegue fazer um movimento em forma de oito com as asas e bem rapidamente consegue ficar voando parado no ar", explica a bióloga Maria Flávia Conti Nunes.

Algumas espécies chegam a comer de oito a dez vezes o peso do corpo por dia. Imagine um homem de 70 quilos comendo até 700 quilos em um só dia. A máquina de voar é impulsionada por um coração que equivale até 5% do peso total do corpo. Em humanos, o coração não ultrapassa 0,5%. Proporcionalmente, o coração de um beija-flor é bem mais pesado que o nosso e bem mais ativo também. Chega a bater – ou melhor, vibrar – até mil vezes por minuto. Mas é a vibração das potentes asas que faz dessas aves um show à parte do mundo selvagem.

O segredo de toda essa habilidade de voo está na rapidez e no movimento das asas desses bichos. O beija-flor-de-garganta-rubi pesa sete gramas e bate as asas 28 vezes em um só segundo. É tanta vibração que até se pode admirar, mas não dá para enxergar as asas deles. Tanto os olhos humanos quanto a câmera não conseguem definir tamanha vibração.

Na imagem digital, a câmera lenta ajuda a nossa percepção, mas não revela todos os movimentos. O motivo é simples: a câmera de TV capta 30 quadros por segundo, quantidade confortável para nossos olhos. Mas os beija-flores conseguem bater as asas até 80 vezes por segundo. São tão rápidos que muitos movimentos nem são registrados.

Mas e se captássemos 1.000 quadros por segundo? É justamente o que faz a câmera de alta velocidade. Com o equipamento tradicional, a capitação é em tempo real, como estamos acostumados a ver. Já com a câmera de alta velocidade, parece que o tempo para. A 1.000 quadros por segundo, temos o efeito de superslow, com muito mais definição. Em outras palavras, espichamos o tempo. Segundos viram minutos.

Quando apontamos a lente para os beija-flores, enxergamos o que os olhos não veem. Toda a beleza do voo dessas aves é revelada em minúcias. A vibração das asas desaparece. Agora, mais do que nunca, podemos comprovar: em uma fração de segundo, o beija-flor realmente para no ar.

O beija-flor é pequeno, mas forte. Os músculos peitorais podem chegar até um terço do peso total da ave. De que outra maneira poderíamos ver a acrobacia para ganhar impulso e subir? As abelhas e marimbondos, companheiros na busca pelo açúcar, estão sempre por perto. Às vezes, até demais.

Os beija-flores têm uma importante missão na natureza. As flores lhes dão o alimento e, em troca, eles garantem a reprodução delas, graças a um detalhe.

“Eles têm que colocar o bico, às vezes, toda a cabeça dentro da flor para sugar esse néctar. E quando ele faz isso, o pólen da planta fica grudado no bico ou na testa. Quando ele vai se alimentar em outra flor, pode polinizar, levando esse pólen para completar o ciclo da reprodução", esclarece Maria Flávia Conti Nunes.

Ao visitar uma planta, o beija-flor talvez pense estar apenas se alimentando. E, mesmo sem saber, contribui para multiplicação da vida. Essa tarefa também é feita pelos insetos e até por morcegos. Mas uma coisa é certa: nenhum faz isso com tanta graça e beleza.

Acompanhe os primeiros meses de vida do gavião-real
Filhote da mais poderosa ave de rapina do mundo recebe todo cuidado dos pais até aprender a voar e se alimentar sozinho.

Quanto vale um barjão? A árvore se destaca na mata com cerca de 30 metros de altura. Tanto que foi escolhida como a árvore da vida por um casal de harpias. No ninho formado por galhos e gravetos, dois ovos são chocados. A fêmea é maior: tem cerca de 90 centímetros de altura e pesa dez quilos. O macho não ultrapassa 60 centímetros.

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A mais poderosa ave de rapina do mundo, também chamada de gavião-real, impressiona qualquer um. As asas de uma ponta a outra medem dois metros. As patas potentes exibem garras afiadas de até sete centímetros. É o mesmo tamanho das garras de um urso-preto. Junte a isso um bico forte desenhado para cortar a carne de presas: mamíferos de médio porte, como o bicho-preguiça, o macaco-prego, as cutias e até cobras, entre outros. E pelo olhar desse predador, não restam dúvidas: ele está no topo da cadeia alimentar.

Encontrar uma harpia em ambiente natural é sempre um acaso. Esse predador fica sempre em um galho alto, imóvel, à espreita das presas. Achar um ninho de harpias é ainda mais difícil. Um deles foi encontrado em 2005. De lá para cá, o mesmo casal de harpias já fez o ninho três vezes na mesma árvore. Por isso, até uma escada foi montada na árvore em frente ao ninho. Lá no alto, uma plataforma para poder observar melhor esses predadores. O ponto fica a cerca de um metro abaixo do nível do ninho. É uma visão privilegiada de cada detalhe da reprodução do maior predador de nossos ares.

Tudo começa no verão, quando o verde das árvores é mais intenso. É um dos mais longos períodos de reprodução no mundo das aves. A fêmea passa cerca de dois meses chocando os ovos e, depois, mais meio ano alimentando a cria. Assim que nasce um filhote, o outro ovo é descartado. Alguns dias após o nascimento, o "bebê-harpia" dá o ar da graça. A penugem totalmente branca já destaca o bico negro do futuro predador. Mas antes de se tornar um caçador, o filhote – além de crescer – tem muito a aprender.

Mesmo quando parece estar sozinho, o casal está por perto. A mãe é a que mais fica no ninho. Para o filhote, o ninho significa segurança, de onde ele não sai. Só se arrisca na borda na hora das necessidades básicas. A sujeira tem que ser jogada para longe. É preciso manter o ninho sem parasitas.

A alimentação é feita pelo casal, com pedaços de animais caçados na floresta. Nos primeiros meses, o jovem gavião-real é alimentado no bico. E o trabalho dos pais não se limita a isso. Como as carcaças de bichos ficam no ninho vários dias, macho e fêmea levam sempre galhos verdes para cobri-las.

O naturalista canadense Bradley Davis acompanha a reprodução de harpias há quase dez anos e tem uma explicação para o dedicado trabalho dos pais. “Eu acho que tem a ver com a presença de muitas moscas que vêm atraídas pela carniça no ninho. É um repelente natural. É um cuidado constante deles. Até o macho trás galhos verdes durante o acasalamento como um jeito de agradar a fêmea”, aposta.

O filhote parece brincar com as folhas verdes. De repente, a fêmea começa a pirar alto. O som forte ecoa na floresta. Seria para chamar o macho? Logo, ele aparece e, em pouco tempo, vai embora de novo. Horas depois, lá vem ele e trás mais comida. Em média, a cada dois dias, uma carcaça de animal é trazida.

Bradley Davis explica que tipo de animal eles levam para alimentar: “Macaco-prego e muitas cutias, o que é interessante por ser um animal terrestre. Há outros macacos de vários portes. Eles sempre trazem os animais em partes, geralmente decapitados, mas nunca inteiros”.

De barriga cheia, a pequena harpia retribui o cuidado da mãe. Dois meses depois, o filhote dobra de tamanho. A plumagem branca dá lugar às primeiras penas e já tem pose de adulto. Ainda sem poder sair do ninho, o jeito é conhecer os bichos da floresta que passam por perto. Qualquer movimento próximo chama atenção do futuro predador. Aves como alma-de-gato, surucuas e bico-de-brasa. Já os macacos-aranha parecem provocar o instinto de caça. Os olhos do filhote são só atenção.

A rotina do ninho prossegue. Ora o calor é tanto que chega a dar sono, ora a chuva não dá trégua.

Mais um mês, e o filhote já mostra habilidade. O macho incentiva o jovem predador a comer sozinho, e ele aprende. O pai só ajuda nos pedaços mais difíceis de cortar. Por falar em habilidade, a pequena harpia já começa a exercitar as asas.

Em julho, época da seca na Amazônia, as folhas das árvores perderam um pouco do verde. E, se não fosse pelo tom das penas, o jovem filhote poderia ser confundido com os pais. Falta pouco para o primeiro voo. Ele já se arrisca, sai do ninho, sobe no galho, mas escorrega. Tenta de novo e consegue. Volta para o ninho com tranquilidade, pula e exercita as asas. Vai para os galhos mais altos e está pronto para caçar. Parece sentir o gosto da liberdade. Mas o ninho é sempre referência. E se engana quem acha que agora a alimentação é mais intensa.

Bradley Davis explica que os pais levam comida, a cada dois ou três dias, durante os primeiros meses. Quando o filhote já está crescido, ele pode ficar de três a quatro dias sem comer. “Ele fica bem desesperado esperando por comida, gritando”, conta o naturalista.

Com seis meses de vida, o filhote atinge a fase adulta. E depois de passar os últimos dois meses exercitando as asas praticamente todos os dias ele já sabe voar e está prestes a abandonar o ninho. Mas ainda vai depender dos pais para se alimentar por mais um ano até descobrir os segredos da selva e aprender a caçar sozinho.

Entre as lições a serem aprendidas está o grande desafio de manter-se vivo. Afinal, a harpia está na lista de animais ameaçados de extinção. O motivo é a diminuição das matas. O local onde as imagens foram gravadas é um bom exemplo.

Em uma das regiões mais desmatadas do Brasil, o casal de harpias fez o ninho em uma área com cerca de 100 hectares de floresta nativa, praticamente no centro da cidade de Alta Floresta, no Mato Grosso. As harpias só nidificam na região graças à diversidade de vida que insiste em permanecer naquele pequeno trecho de floresta.

“Pelo que todos os pesquisadores disseram, esse fragmento é muito rico em biodiversidade. Nós temos primatas, roedores, muitas aves. Então, a diversidade é grande. Elas encontraram comida para ficar nesse fragmento”, ressalta o ambientalista Vitória da Riva Carvalho.

O ninho é um exemplo: desde que exista uma mínima condição, a vida está disposta a resistir. A natureza sempre tem algo a nos ensinar.

Bradley Davis revela o que observou de mais curioso no comportamento de reprodução das harpias neste período: “Achei muito interessante o fato de que os adultos desmancharam o ninho totalmente, como uma forma de mandar o filhote embora. E funcionou bem”.

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